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Vaso de pressão não é LEGO - Segurança em vasos de pressão

  • Foto do escritor: Fabio Roberto
    Fabio Roberto
  • 12 de ago.
  • 5 min de leitura

Atualizado: 13 de ago.

A segurança em vasos de pressão não é opcional. Pode parecer simples unir chapas calandradas e um tampo, mas, na prática, um vaso de pressão é um equipamento projetado para conter energia armazenada em gás comprimido. Quando tudo está conforme as normas, essa energia é liberada de maneira controlada e segura. Contudo, se algo falha, a liberação pode ser súbita e violenta. Por isso existem normas, procedimentos e qualificações específicas — são eles que distinguem a rotina produtiva de um acidente grave. 


Trabalhador em macacão azul monta um vaso de pressão vertical feito com blocos de LEGO coloridos, utilizando uma escada em um ambiente de oficina industrial. A cena ilustra, de forma lúdica, a mensagem do artigo sobre a importância de não tratar a fabricação de vasos de pressão como uma montagem simples, reforçando a ideia de que “vaso de pressão não é Lego”.

Comparando energia dos Vasos de Pressão com TNT


Sem precisar ser engenheiro, entende-se que TNT concentra muita energia. A comparação é apenas uma referência de magnitude, não uma previsão de dano. Um vaso não é um explosivo: a energia só é liberada de forma perigosa em caso de falha estrutural grave:


  • 1.000 L a 10 bar → 0,33–0,63 kg de TNT

  • 1.000 L a 35 bar → 1,38–3,08 kg de TNT

  • 3.000 L a 10 bar → 0,98–1,89 kg de TNT

  • 10.000 L a 10 bar → 3,26–6,30 kg de TNT 


Não é para assustar, é para lembrar que um vaso de pressão não se trata como serralheria pesada.


O erro mais comum: peças soltas "para montar em casa"

Muitas empresas solicitam apenas chapas calandradas e tampos soltos, às vezes em aço SAE 1010/1020 e com espessura acima do usual, acreditando que isso é suficiente para garantir segurança. Isso parece lógico — “mais grosso é mais forte” — mas espessura, por si só, não garante segurança. Sem cálculos, soldagem qualificada e material especificado, a espessura pode se tornar peso inútil ou, pior, representar um risco maior.


Onde costuma dar errado:


  • Ausência de premissas de projeto: falta definição da pressão máxima admissível (PMTA), temperatura de projeto e margem de corrosão;

  • Tampo errado: formatos como elíptico 2:1, torisférico ou hemisférico têm exigências específicas de raio e espessura;

  • Material inadequado: SAE 1020 pode ser bom para outras aplicações, mas talvez inadequado para o fluido, temperatura e método de fabricação do vaso;

  • Solda sem qualificação: experiência do soldador não substitui procedimento (WPS), material correto e ensaios registrados;

  • Sem ensaios nem rastreabilidade: teste hidrostático isolado não detecta falhas internas como falta de fusão, trincas ou inclusões;

  • Falta de documentação: sem prontuário técnico, placa, relatórios de junta e END, o equipamento não atende à NR‑13 e será reprovado. 


ASME VIII: cada decisão faz diferença

Ao mencionar "seguir código", refere-se principalmente à ASME Boiler and Pressure Vessel Code – Seção VIII, Divisão 1, aplicada à maioria dos casos industriais. Veja os pontos críticos que podem alterar radicalmente o projeto:


  • PMTA e Pressão de Projeto: são parâmetros-chave para definir a espessura e a segurança;

  • Temperatura de Projeto e MDMT (temperatura mínima): em baixas temperaturas, exige-se ensaio adicionais e tratamentos diferenciados para evitar fratura frágil;

  • Margem de Corrosão: a espessura deve considerar a corrosão prevista ao longo da vida útil;

  • Forma do tampo: normas definem formas, raios e espessuras mínimas; escolher errado pode fragilizar o conjunto;

  • Eficiência da junta: varia conforme o tipo de solda e o nível de END aplicado — mais inspeções (radiografia, ultrassom) possibilitam espessura menor com segurança;

  • Materiais: devem ser listados na ASME Seção II, com tensões admissíveis apropriadas;

  • Tratamento térmico pós-solda: exigido em certas espessuras/materiais para aliviar tensões e aumentar tenacidade (PWHT);

  • Teste hidrostático: pressão e critérios seguem norma, considerando PMTA e tensões entre temperaturas de teste e de projeto. Teste pneumático só para casos específicos.

"Vaso de pressão não é Lego. Alterar material, END ou trocar o formato do tampo não é detalhe: muda a espessura, altera os esforços, aumenta o peso, impacta o custo e, principalmente, coloca a segurança em risco. Em vasos de pressão, não existe 'só trocar uma pecinha' — cada mudança exige recalcular todo o projeto."

Tampos não são todos iguais

O tampo representa metade da segurança do vaso e um dos elementos mais críticos. A curvatura influencia a distribuição de tensões. Por isso, a norma especifica formas, raios e espessuras mínimas, não é estética: escolha errada pode concentrar tensões, causar ovalização sob pressão e gerar fissuras ao longo do tempo.


Antes de encomendar um tampo, avalie:

  • Forma mais indicada para pressão e diâmetro;

  • Espessura mínima após conformação (não apenas da chapa bruta);

  • Tolerâncias admissíveis de ovalização e altura;

  • Tipo de união tampo-costado e eficiência da junta prevista.


Espessura exagerada não é sinônimo de segurança


Aumento de espessura eleva o peso, causa distorções por tensões residuais na soldagem, pode exigir aquecimento maior (alterando metalurgia e favorecendo trincas). Também aumenta exigências de suporte e dificulta soldagem em campo. A espessura deve ser definida por cálculos, segurança vem de correta distribuição de tensões, válvula de segurança e inspeções em dia.


Material SAE 1010/20 — um erro comum

Aço carbono de baixo teor (SAE 1010/1020) não é aceitável para vasos de pressão. Não consta na ASME Seção II, Parte D, e não possui propriedades mecânicas nem tenacidade adequadas. Seu uso representa não conformidade e risco elevado — inclusive legal e trabalhista.


Soldagem e qualificação — em linguagem simples

Uma junta precisa mais que aparência: exige procedimento qualificado (WPS), soldador habilitado e registro documentado, é como uma receita testada. Sem isso e sem ensaios, você só percebe o defeito depois, quando pode ser tarde demais.

Ensaios não destrutivos não são perfumaria

Cada ensaio identifica distintos tipos de defeitos: alguns mapeiam superfícies, outros internos. O teste hidrostático, isoladamente, não revela tudo, é como revisar um carro só pela limpeza: bonito por fora, mas sem saber o estado interno.


Documentação indispensável

Na operação, alguém precisa assumir responsabilidade. Sem isso, ninguém assume — e não passa em auditoria.


Checklist mínimo necessário:

  • Projeto adeequado e as-built

  • Prontuário com premissas

  • Placa de identificação

  • Certificados e rastreabilidade dos materiais

  • Relatórios de soldagem e de END

  • Relatório de teste hidrostático (com pressão e tempo)

  • Calibração dos instrumentos usados

  • ART do responsável técnico


Antes de solicitar "corpo calandrado e tampo", responda:


  • Qual a pressão e temperatura de projeto?

  • Qual o tipo do fluido? Toxico? Inflamável? Como devo lidar com isso?

  • Forma do tampo e espessura mínima após conformação?

  • Eficiência de junta prevista?

  • Quais ensaios serão aplicados em cada junta?

  • Quem se responsabilizará pelo cálculo do vaso?

  • Qual a pressão do teste hidrostático, com quais instrumentos?

  • Como dimensionar a válvula de segurança?

  • Como garantir a rastreabilidade dos materiais?

  • Qual será o plano de inspeção para atender ASME e NR‑13? 


Se você não consegue responder com segurança a todas essas perguntas, não é hora de comprar peças soltas. É hora de transformar isso em um projeto profissional, contrate uma empresa com tradição, experiência e capacidade técnica para garantir projeto, fabricação e inspeção conforme normas aplicáveis, com qualidade e segurança desde a primeira solda até a entrega final.


NR-13 e operação segura

Após a fabricação, começa a fase mais longa: operação e inspeção. A NR‑13 exige cadastro, prontuário, categoria, profissionais habilitados, inspeções externas e internas periódicas, registros atualizados. Se houve alteração de fluido, pressão, processo ou local, reavalie as premissas.


Sinais de alerta em campo:

  • Placa ilegível ou divergente do prontuário;

  • Válvula de segurança sem lacre ou sem teste recente;

  • Corrosão, vazamentos, pintura estufada;

  • Vibrações, ruídos, condensado sem dreno funcional;

  • Alterações de processo sem revisão de cálculo e proteção. 


Mitos e verdades


  • Mito: Espessura resolve tudo.

    Verdade: Às vezes a espessura resolve, mas cria outros problemas.

  • Mito: Soldador experiente dispensa documentação.

    Verdade: Sem WPS, PQR, WPQ e END, só percebe o defeito depois, quando pode custar vidas.

  • Mito: Teste hidrostático prova tudo.

    Verdade: É indispensável, mas não substitui END.

  • Mito: Vaso pequeno é inofensivo.

    Verdade: Mesmo um vaso de 50 L a 10 bar libera energia equivalente a ~32 g de TNT (Equivalente a explosão controlada de demolição de pequeno porte, no sentido energético).


Um vaso de pressão é um sistema integrado, não apenas um kit de peças.


Em vaso de pressão, atalho significa risco. O caminho correto é o que preserva vidas e garante a segurança da operação.


Eng. Fabio Roberto.


Ilustração de um vaso de pressão vertical em cenário de explosão, com tampa e fragmentos sendo projetados para cima e fumaça se espalhando. No chão, um funcionário usando capacete e uniforme está caído, representando vítima de acidente industrial. A cena destaca visualmente os riscos de falha grave em vasos de pressão, servindo como alerta de segurança.

 
 
 

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